Olá, meus amigos e amigas que acompanham a coluna “Fala Concurseiro”.
Foi com muita alegria que recebi o generoso convite do professor Maurício Cunha, um grande mestre que mostra dia após dia que é possível chegar ao mais elevado nível profissional e intelectual resguardando a simplicidade e preservando o olhar de entusiasmo e o sorriso amigável que contagiam os que o circundam. Obrigado, meu querido amigo.
De início, meus queridos, devo alertá-los que aqui trago impressões absolutamente pessoais de um homem que acessou a faculdade um pouco mais tarde e que, por via de consequência, começou os seus estudos para a magistratura quando já não era tão jovem.
Todas as suas características individuais devem ser levadas em consideração e você deve construir a estrada que dá acesso ao seu sonho com as ferramentas e instrumentos que estão à sua disposição. Não há verdades absolutas quando tratamos desse tema e cabe a você descobrir a sua maneira, o seu jeitinho que vai te fazer evoluir.
Ademais, é preciso ter noção de que os concursos desse nível demandam dedicação por muito tempo. É uma preparação pautada na repetição e eu levei quase 6 anos para ser aprovado. Não se deve pretender alcançar resultados muito rapidamente, sob pena de trazer para seus ombros uma carga desnecessária e de ficar vulnerável às crises de ansiedade que têm atingido grande parte dos colegas concurseiros, principalmente os que acessam diariamente as redes sociais e tendem a comparar seus resultados com os de outras pessoas.
Eu comecei a estudar com 35 anos, casado, com uma filha de 3 anos e outra de alguns meses, trabalhando normalmente e tendo que controlar meu sono durante o meu pouco tempo de estudos. Não poderia comparar os meus meios com os de um jovem solteiro, sem filhos e que deixou recentemente os bancos da universidade.
Se eu fosse pensar que, naquele momento, em algum lugar do Brasil, alguém estaria assistindo às aulas de um bom curso pela manhã, estudando as melhores doutrinas pela tarde, indo para sua academia e, depois, estudando a jurisprudência à noite enquanto que eu só conseguia ler alguma lei e informativo na madrugada, eu teria ficado pelo caminho.
Deve-se, portanto, solidificar a ideia de respeito às suas características pessoais e estabelecer a premissa de que a construção do conhecimento que os fará avançar é de médio ou longo prazo. Trabalhar isso na sua cabeça pode te ajudar bastante.
Pois bem.
É interessante pontuar que uma das importantes características que me fizeram optar por essa carreira é que há uma maior padronização dos certames quando comparada a outras igualmente jurídicas. O Conselho Nacional de Justiça, através da Resolução 75/09, traz um importante regramento que busca essa uniformização. Na minha tomada de decisão pela magistratura estadual, considerei, em grande medida, a possibilidade de preparação conjunta para várias provas que seriam realizadas nas mais diversas Unidades da Federação e isso me permitiu estudar várias vezes o mesmo conteúdo programático e criar uma boa relação com as disciplinas cobradas.
Curial perceber que a forma de exigência muda a cada fase do concurso e é um grande desafio estar preparado para todas elas. Com base nisso, reputo relevante apresentar as características de cada etapa separadamente, apontando algumas estratégias que tiveram um papel importante na minha evolução.
Milhares de candidatos e inscrevem e se encontram nos mais diversos locais de prova de algum lugar desse país para tentar marcar a opção certa no gabarito. Chegou a fase objetiva. Em regra são 100 questões de múltipla escolha que versam sobre 12 disciplinas (Direito Civil; Direito Processual Civil; Direito da Criança e Adolescente; Direito do Consumidor; Direito Constitucional; Direito Penal; Direito Processual Penal; Direito Eleitoral; Direito Administrativo; Direito Ambiental; Direito Empresarial e Direito Tributário).
Há, sem dúvida, a necessidade de se construir uma base de estudos e, para isso, é interessante considerar a escolha de um bom manual ou uma sinopse que te acompanhará durante toda a sua preparação, com a evidente preocupação com as atualizações jurisprudenciais e legislativas que ocorrerem com o passar do tempo. Mudar muito o material pode ser ruim para a fixação do conteúdo.
No início da minha caminhada, busquei estudar da maneira mais abrangente possível com o objetivo de fazer uma preparação para todas as fases ao mesmo tempo. Grande parte do meu dia era dedicada à leitura de livros de doutrina, pois tinha a preocupação de não conseguir me dar bem nas fases mais avançadas sem um bom conhecimento teórico. É um raciocínio interessante e deve ser levado em consideração pelos estudantes que têm mais tempo ou que se dedicam integralmente aos estudos.
Entretanto, fui percebendo que eu não conseguia avançar muito e essa maneira não funcionou muito bem comigo. O meu tempo era escasso. Tive que fazer uma análise do que mais era cobrado nas primeiras fases e centrar minhas forças em fazer com que a prova objetiva deixasse de ser um problema para mim, mesmo sabendo da minha possível dificuldade nas fases seguintes.
Nesse contexto, dei início a uma análise das provas anteriores identificando os temas mais cobrados por cada banca e como eram exigidos em cada disciplina. Com base nesse levantamento percebi que havia temas que estavam nas provas com mais frequência e que o peso da leitura do texto da lei aliado a um estudo dedicado do entendimento dos Tribunais Superiores me possibilitariam aumentar as minhas notas nessa fase.
A leitura seca de lei passou a ser o meu principal meio de estudo para essa fase e comecei a resolver todas as questões da carreira e das bancas e passei a alimentar um banco de dados com cada dispositivo legal que era cobrado. Comecei a direcionar meus estudos de doutrina nos temas eminentemente teóricos e que tinham a simpatia dos examinadores. Deixei de lado as leituras capa a capa que pretendia fazer no início.
Para avançar à fase seguinte, os candidatos devem alcançar uma pontuação que tem variado entre 75 e 80 pontos em média, o que é bem alto para o nível das provas. Por essa razão, ficou claro para mim que eu só conseguiria alcançar esse patamar se fizesse uma preparação específica para a 1ª fase e com as seguintes passei a me preocupar tão somente quando nelas estava. A partir dessa mudança de estratégia, minha notas ficaram acima de 80 e passei a avançar com mais facilidade.
Vamos seguir.
Finalmente alcançou a nota de corte, que maravilha não é?! 300 candidatos seguem no concurso dentre os milhares que ficaram de fora. Estar aqui é um grande acontecimento e deve ser celebrado. Lembro muito bem da minha primeira vez. A sensação de pertencer a um grupo tão delimitado encheu meu coração de alegria e serviu de grande estímulo a prosseguir.
Algum tempo depois do resultado, você estará com seu Vade Mecum na mão em uma sexta-feira, resolvendo questões discursivas das disciplinas descritas acima e será avaliado também nas matérias de humanística trazidas no edital. Nos dias seguintes desse mesmo fim de semana, fará uma prova de sentença cível e outra de sentença penal. Se conseguir nota 6,00 na discursiva terá suas sentenças corrigidas e precisará de outras duas notas 6,00 para avançar para a prova oral.
Não há muito tempo entre o resultado e sua prova e, em decorrência disso, o candidato deverá utilizar o seu próprio material de estudos, os seus resumos, suas anotações, seus grifos dos livros, para revisar os assuntos que serão cobrados.
Existem cursos e livros específicos sobre as disciplinas de humanística e que ensinam as técnicas de sentença que valem a pena adquirir.
Além de um estudo dedicado, não se pode perder de vista que os treinos têm um papel fundamental na sua evolução e podem determinar a sua aprovação. Existem cursos que formulam casos específicos e disponibilizam aos alunos que os imprimem, redigem as sentenças e questões à mão, digitalizam e enviam aos professores que corrigem de acordo com o espelho por eles formulado. Esse treino é muito importante para controle de tempo e de espaço e as correções são muito valiosas para a construção do seu aprendizado.
A análise dos espelhos trazidos pelas bancas em provas anteriores também é importante, na medida em que se pode identificar como as bancas cobram determinados temas e como distribuem a pontuação nos padrões de respostas.
Dias de espera, nota acima de 6,00 na discursivas e as notas das sentenças prestes a sair, palpitações e a mente borbulhando. Saiu o resultado, ligações para os familiares, lágrima e pulos de alegria, chegou a prova oral. Esse é um grande momento para os que estão há anos na caminhada, é a percepção de que está ocorrendo a tão buscada materialização do sonho. Vários nem acreditam que finalmente avançaram, seguem pensando que não sabem absolutamente nada e que estão ali por um acidente de percurso.
Uma prova separa você do seu cargo. A aprovação pode estar logo ali e isso causa um temor absurdo de deixar escapar pelos dedos. Uma reprovação a essa altura seria absolutamente frustrante e, por isso, dá-se início à mais exaustiva e árdua preparação. Não há mais tempo a perder, você está prestes a ser Juiz de Direito.
É um cenário de grande tensão e insegurança. A preparação é a mesma em termos de conteúdo, mas a maneira de se estudar muda. Não é só leitura, é leitura com a preocupação de ser capaz de expor aquilo que você aprendeu para pessoas estarão te avaliando. Nada disso estava presente nas outras fases, é um mundo novo. O estudo será mais verticalizado em determinados assuntos conceituais e teóricos e surgirá a necessidade de maior aprofundamento nos fundamentos das decisões proferidas pelo STF e STJ.
Sem minimizar a importância das suas leituras individuais em sua casa, ouso dizer que a melhor preparação para a prova oral está nos treinos realizados entre os próprios candidatos aprovados. Grupos são formados e os membros realizam sorteios de duplas que elaborarão questões e espelhos de respostas e simularão as arguições durante os dias da semana. Os primeiros treinos são angustiantes e há um evidente constrangimento. Muitos candidatos de nível muito alto têm desempenho ruim em razão do nervosismo que envolve cada simulação. Percebe-se rapidamente que passa ao largo de ser somente conhecimento jurídico.
Mas, a despeito de toda essa ambiência assustadora, devo dizer que os estudos e os treinamentos conseguem mostrar impressionantes evoluções até mesmo daqueles colegas que há poucos meses ou semanas não conseguiam formular respostas em razão da dificuldade de falar em público. Vale acrescentar que existem bons cursos de oratória e de treinamento contínuo que podem ajudar os candidatos que não aderirem aos treinamentos com os colegas e que se dispõem a pagar um profissional.
Prepare-se para a emoção da aprovação. Não consegui até hoje descrever esse sentimento e não sei se um dia conseguirei.
Por fim, os aprovados na prova oral apresentarão seus títulos para acrescentar pontuação à sua média final. Essa fase não possui caráter eliminatório, mas somente classificatório.
Meus amigos, quero dizer que há algum tempo eu via a minha aprovação como algo inatingível e é realmente difícil iniciar essa trilha com olhos já no final do processo. Como se manter estimulado quando se busca algo que se mostra tão abstrato no começo de tudo.
Claro que é importante se ver no cargo, sonhar com as possibilidades que o salário te proporcionarão, mas sugiro que vocês vibrem com pequenas realizações durante a caminhada. Pode ser uma quantidade maior de concentração, mais tempo dedicado aos estudos naquela semana, não deixem de celebrar o aumento de cada ponto nas suas provas, lutem para chegar à nota de corte. É um processo que se desenvolve lentamente e a evolução nem sempre é perceptível. De repente o resultado chega e é algo extraordinário.
Espero, verdadeiramente, vê-los com o peito transbordando de satisfação, com sorriso no rosto e com muito orgulho de não ter desistido. Hoje, aos 41 anos de idade, estou prestes a assumir o cargo de Juiz de Direito do Estado do Pará e absolutamente tomado por essa felicidade.
Desejo o mesmo a vocês.
Abraço forte.
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