- Considerações iniciais
Em mais de uma oportunidade defendi a adoção de um regime único de tutela jurídica da garantia da imparcialidade (ver aqui e aqui). Parte disso significa abandonar para todos os fins qualquer distinção entre impedimento e suspeição, o que atrai inúmeras consequências, sendo aqui relevante recordar a congregação das hipóteses legais num bloco monolítico de eficácia transprocedimental[1]. Dada a sua unidade ontológica (todas veiculam quebras de imparcialidade e merecem idêntico desvalor), é injustificável, v. g., que, apenas em razão da natureza do procedimento, a mesma hipótese represente e não represente parcialidade do juiz. A imparcialidade não é mais relevante num tipo de procedimento do que em outro.
Neste ensaio, volto ao tema para explorar uma decisão do STF que bem demonstra quão deletério é o regime misto de tutela jurídica da imparcialidade, particularmente no que concerne à admissão de que dada hipótese de parcialidade incida em um procedimento, mas não em outro. Cuida-se da Arguição de Impedimento nº 45/RJ, formulada no bojo do Habeas Corpus nº 146.247/RJ, em que se alegava o impedimento de um Ministro da 2ª Turma do STF porque sua esposa integrava o quadro de sócios do escritório que assistia os interesses do réu-impetrante, nos termos do art. 144, VIII, CPC[2], com base no art. 3º, CPP[3], e não foi sequer examinada no mérito. Como pretendo demonstrar, ele é fruto de um arranjo que já tarda em ser abandonado se quisermos levar a garantia da imparcialidade (minimamente) a sério.
- A Arguição de Impedimento nº 45/RJ (STF)
Segue a decisão monocrática do Presidente do então STF, que reconheceu a perda de objeto da arguição:
DECISÃO:
Vistos.
O então Procurador-Geral da República Dr. Rodrigo Janot Monteiro de Barros, arguiu o impedimento e suspeição do Ministro Gilmar Mendes, Relator sorteado para processar e julgar o HC nº 143.247/RJ, impetrado neste Supremo Tribunal. O caso foi bem relatado da seguinte forma pela então Presidente da Corte, eminente Ministra Cármen Lúcia:
“2. O Arguente afirmou que ‘sob qualquer prisma, a presente arguição de impedimento e suspeição é tempestiva. Restou observado o prazo para seu ajuizamento’ (fl. 6).
Alegou que ‘o Código de Processo Penal não prevê explicitamente algumas das hipóteses de impedimento e suspeição dos arts. 144 e 145 do Código de Processo Civil, tais como as dispostas em seus respectivos incisos VIII e III. No entanto, por força do art. 3º do Código de Processo Penal, essas causas de impedimento e suspeição haverão de incidir, também, na esfera processual criminal, especialmente em decorrência do princípio da imparcialidade, de nível normativo hierárquico superior, seja ele constitucional ou supralegal’ (fls. 13-14).
Argumentou que ‘o julgamento por um magistrado de uma causa penal na qual figure como parte um cliente do escritório de advocacia do cônjuge do julgador ou um devedor de seu cônjuge, como previsto nos arts. 144, inciso VIII, e 145, inciso III, do Código de Processo Civil, contraria diretamente a exigência de imparcialidade, particularmente em seu aspecto objetivo. Em situações como essa há inequivocadamente razões concretas, fundadas e legítimas para duvidar da imparcialidade do juiz, resultando da atuação indevida do julgador no caso uma clara frustração da confiança dos cidadãos na isenção do Poder Judiciário’ (fls. 14-15).
Sustentou que ‘aquilo pelo qual se propugna é exatamente a aplicação subsidiária, ao processo penal, de dispositivos legais existentes e em vigor do Código de Processo Civil, a partir de interpretação extensiva do art. 252 do Código de Processo Penal, que, em sua redação atual, concretiza de forma insuficiente e demasiadamente restrita sua própria finalidade: a garantia de imparcialidade do juízo’ (fl. 16).
Afirmou que ‘Eike Fuhrken Batista, paciente do Habeas Corpus n. 143.247/RJ, é representado processualmente pelo Escritório de Advocacia Sérgio Bermudes’ (fl. 17) e que ‘Guiomar Feitosa de Albuquerque Lima Mendes, esposa de Gilmar Ferreira Mendes, integra o escritório de advocacia de Sérgio Bermudes’ (fl. 19).
Concluiu que ‘o Ministro Gilmar Ferrreira Mendes não poderia atuar como relator do Habeas Corpus n. 143.247/RJ no Supremo Tribunal Federal. Incide no caso a hipótese de impedimento prevista no art. 144, inciso VIII, do Código de Processo Civil, cumulado com o art. 3º do Código de Processo Penal, a qual estabelece que o juiz não poderá exercer jurisdição no processo ‘em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório’’ (fl. 19 – grifos no original).
Anotou também que ‘Ainda que não se entenda aplicável ao caso o dispositivo legal em questão, o que se cogita em atenção ao princípio processual da eventualidade, o fato de o paciente do Habeas Corpus n. 143.247/RJ, Eike Fuhrken Batista, ser cliente do escritório de advocacia em que trabalha e da qual é sócia Guiomar Feitosa de Albuquerque Lima Mendes torna seu marido, o Ministro Gilmar Ferreira Mendes, suspeito para atuar como magistrado na espécie, principalmente na condição de relator. Realmente, como cliente do Escritório de Advocacia Sérgio Bermudes, Eike Fuhrlen Batista caracteriza-se como devedor de honorários, ainda que indiretamente, de Guiomar Feitosa de Albuquerque Lima Mendes, por meio de sua participação nos lucros da sociedade advocatícia. Resta configurada, assim, a causa de suspeição prevista no art. 145, inciso III, do Código de Processo Civil, cumulada com o art. 3º do Código de Processo Penal, a qual dispõe que há suspeição do juiz ‘quando qualquer das partes for sua credora ou devedora, de seu cônjuge ou companheiro ou de parentes destes, em linha reta até o terceiro grau, inclusive’’ (fls. 19-20 – grifos no original).
3. Com base nos argumentos apresentados, requereu ‘o julgamento da presente arguição de impedimento e suspeição, pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal, como procedente, com a declaração de incompatibilidade do Ministro Gilmar Ferreira Mendes para atuar no Habeas Corpus n. 143.247/RJ e da nulidade dos atos decisórios por ele praticados’ (fl. 21).”
No intuito de melhor analisar o eventual processamento da presente arguição, foram requisitas informações da autoridade arguida, o eminente Ministro Gilmar Mendes (fls. 105 a 108).
Com as informações prestadas por Sua Excelência (fls. 113 a 136) e em fase de submissão do caso ao julgamento, sobreveio pedido de vista da Procuradoria-Geral da República “para exame da matéria e manifestação eventualmente cabível”, o que foi deferido pela Ministra Cármen Lúcia (fls. 180 a 183).
Em sua manifestação, a Procuradora-Geral da República Dra. Raquel Elias Ferreira Dodge, opinou pela improcedência da presente arguição de impedimento e suspeição (fls. 187 a 195).
É o relatório.
Decido.
Anoto que a Segunda Turma deste Supremo Tribunal, em julgamento superveniente, datado de 10/10/17, à unanimidade, conheceu e concedeu a ordem no HC nº 143.247/RJ sob a relatoria do arguido, tendo o feito transitado em julgado aos 16/2/18.
Portanto, está prejudicada esta arguição, por conta de alteração no quadro fático-jurídico inicialmente apresentado.
Perfilhado essa linha de raciocínio, destaco as seguintes decisões monocráticas: AImp nº 5/PE, DJe de 12/6/15; AImp nº 47/RJ, DJe de 12/9/18; AImp nº 48/RJ, DJe de 12/9/18; e AImp nº 49/RJ, DJe de 12/9/18.
De qualquer modo, ainda que assim não fosse, a hipótese retratada nos autos conduziria ao reconhecimento da improcedência da arguição, pois, como bem apontou a Procuradora-Geral da República, em sua manifestação, a situação de impedimento descrita
“está contemplada no artigo 144, inciso VIII do Código de Processo Civil e não há idêntica previsão no artigo 252 do Código de Processo Penal.
Assim, não se aplicam, por analogia ou subsidiariamente, as regras processuais civis ao processo penal, que tem rol taxativo de situações que implicam, objetivamente, no impedimento do juiz para o julgamento do caso. Não há lacuna a ser integrada pela regra do art. 3º do CPP.
Quanto às hipóteses de suspeição, também não se vislumbra, da situação (…) narrada, adequação típica às situações previstas no artigo 254 do CPP.
O reconhecimento da suspeição é, antes de tudo, um dever do próprio magistrado de não atuar em situações que possam, por algum motivo, retirar-lhe a devida e necessária imparcialidade.
(…)
No caso ora analisado, o Relator não afirmou suspeição e considera-se plenamente apto, no aspecto, subjetivo, para o julgamento do pedido de habeas corpus. E, sob o aspecto da sua recusa pela parte parta atuação nos autos, cabe a esta Corte apreciar se há adequação típica da situação descrita na inicial à norma do artigo 254 do CPP.
Diante do exposto, opina pela improcedência da presente arguição de impedimento” (fls. 194/195 – grifos nossos).
Ante o exposto, nos termos do art. 21, inciso IX, do RISTF, julgo prejudicada a presente arguição, em razão da perda superveniente de objeto. (Todos os destaques constam do original, que pode ser lido aqui).
2.1. Descrição
Apresentou o então Procurador Geral da República a Arg. Imp. n.º 45, com fulcro no art. 144, VIII, CPC, c/c o art. 3º, CPP, alegando o impedimento do Ministro relator do HC nº 143.247/RJ em razão de a esposa deste figurar no quadro de sócios do escritório de advocacia que patrocinava os interesses do réu, embora ela não participasse diretamente do caso nem estivesse constituída nos autos. Embora o mérito da arguição não tenha sido formalmente examinado – a competência para tanto é do Plenário, nos termos do art. 6º, I, h, RISTF[4] –, houve obter dicta a respeito. Julgando o HC 143.247/RJ, os integrantes da 2ª Turma teceram considerações a respeito, rechaçando-a (ver aqui). A subsequente Procuradora Geral da República opinou pela rejeição, argumentando que no procedimento penal o rol de impedimento é o do art. 252, CPP, e que não havia lacuna a ser colmatada pelo art. 144, VIII, CPC (ver aqui)[5]. Como o HC nº 143.247/RJ foi examinado – admitido e provido, sob relatoria do arguido, inclusive[6] – antes da arguição de impedimento fosse julgada, o então Presidente do STF a concluiu que ela perdeu o objeto.
2.2. Análise
Não pode passar sem registro o entendimento de que a exceção de impedimento perde o objeto com o julgamento superveniente oriundo da sede de onde foi tirada. Ora, se a imparcialidade é o que constitui o Judiciário enquanto tal[7], então “a verificação da imparcialidade do magistrado deve preceder a análise de qualquer outra questão processual ou de mérito”[8] (art. 98, CPP[9]), sendo, de resto, explícito o direito positivo no sentido de que os atos praticados pelo julgador suspeito/impedido padecem de nulidade absoluta (arts. 101[10] e 564, I, ambos do CPP, e art. 285, RISTF[11]). O fato do Regimento Interno do STF prescrever que o Ministro que não reconhecer a suspeição funcionará até o julgamento da arguição (art. 283), a um só tempo negando o efeito suspensivo automático à exceção e mantendo a participação do excepto na sua pendência, em nada altera o fato de que, reconhecida a parcialidade, serão nulos os atos praticados pelo decisor parcial, o que apenas reforça a impropriedade do entendimento de que a exceção de impedimento/suspeição perde o objeto com o julgamento do caso do qual foi tirada. No caso examinado, o espanto é minimizado pelo fato de que foram lançadas várias obter dicta sobre o mérito da arguição, seja pela 2ª Turma, no julgamento do HC nº 143.247/RJ, seja pela posterior Procuradora Geral da República, em seu parecer, seja pelo Ministro Presidente do STF, na decisão que extinguiu a arguição. De todo modo, e por isso mesmo, teria sido muito mais escorreito do ponto de vista dogmático e prudente do ponto de vista republicano conhecê-la e rejeitá-la de meritis. Tanto mais quando o modo como foi decidida passa problemática impressão de que toda e qualquer exceção do tipo será recebida com ojeriza, independentemente dos seus argumentos. Isso porque, o então Procurador Geral da República requereu que o julgamento do próprio HC 143.247/RJ fosse afetado ao Plenário, a quem competia o exame da Arg. Imp. nº 45/RJ. Contudo, o pleito foi tomado na conta da tentativa de manipular a distribuição e a relatoria, além de tumultuar o processo[12]. Por mais que se pudesse considerar infundado o requerimento de afetação ao Plenário – não se confundem o julgamento do HC e da Arg. Imp. –, bastaria rejeitar o requerimento sem qualquer especulação dessa natureza. Quando se sente a necessidade de grafar esse tipo de avaliação, um efeito – desejado ou não pelos julgadores – é a impressão de que a apresentação da exceção, por si só, é percebida como exercício de vilania e improbidade processual, o que é bastante preocupante à tutela jurídica da imparcialidade.
Indo ao ponto de maior relevo, concernente ao regime unitário de tutela jurídica da imparcialidade, parece não haver dúvida de que a arguição fatalmente teria de ser acolhida se derivasse de um procedimento extrapenal. Afinal, o juiz é impedido de exercer suas funções no processo em que figure como parte cliente de escritório de advocacia de seu cônjuge, mesmo que no caso concreto esteja patrocinado por advogado de outro escritório (art. 144, VIII, CPC), e não havia dúvida de que o impetrante do HC 143.247/RJ era cliente, ainda que noutros processos, do escritório de advocacia do qual era sócia a esposa do Ministro do STF relator do caso. Portanto, se no lugar de um habeas corpus estivéssemos diante de uma impugnação derivada de procedimento extrapenal (seja uma ação constitucional, seja um recurso), seria forçoso reconhecer o impedimento. Não se desconhecem as críticas dirigidas ao art. 144, VIII, CPC[13], nem as inegáveis dificuldades práticas reconhecidas até mesmo pelos que louvam o seu caráter republicano[14], mas em termos dogmáticos o dispositivo só pode deixar de ser aplicado se for reconhecida a sua inconstitucionalidade, não bastando afirmar a sua irrazoabilidade, isto é, a sua incompatibilidade com o devido processual legal substancial, um conceito sem rigor dogmático cuja aplicação escapa a qualquer controle[15], e, de resto, constitui importação indevida de uma criação bastante peculiar da doutrina e pela jurisprudência estadunidenses para justificar o judicial review, aproveitando a única expressão constitucional suficientemente clara para tanto, mas que não tem nenhuma utilidade ou relevância em outros países, sobretudo o Brasil[16]. Pior ainda a opinião irônica sobre o mesmo, que diz ser uma das “genialidades do CPC”, como se fez no HC 143.247/RJ[17]. Além do argumento da natureza do procedimento, nenhuma outra razão é dada para justificar o porquê de o art. 144, VIII, CPC, não se aplicar ao procedimento penal. E ficamos assim: nos procedimentos extrapenais, o juiz X fica impedido de atuar nos casos em que figure como parte alguém que é cliente do seu cônjuge/companheiro/parente, mesmo que este não esteja constituído nos autos nem esteja atuando diretamente na causa; nos procedimentos penais, não. Como se a imparcialidade fosse mais importante num procedimento do que noutros. Aliás, uma questão: prevalecendo essa orientação do STF, o art. 144, VIII, CPC, incide ou não nas ações de improbidade administrativa, cuja natureza é objeto de eterna disputa (penal ou extrapenal)?
- Considerações finais
Intuitivamente, soa estranho que o juiz atue num caso em que atua o escritório de advocacia do qual o seu cônjuge é sócio, ainda que ele não esteja constituído nos autos nem atue diretamente no caso. Se falarmos de estética de imparcialidade, amplamente reconhecida pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos e pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, teremos boas razões para falar em quebra de imparcialidade em caso que tal. Sem embargo, a hipótese está claramente regrada no art. 144, VIII, CPC, aplicável ao procedimento penal pela via do art. 3º, CPP – e, vale acrescentar, do art. 15, CPC. Nem se invoque o temor com a interpretação extensiva e o emprego da analogia, tão comum na hermenêutica penal e procedimental penal, pois aqui se cuida de ampliar o espectro de incidência da imparcialidade, o que fortalece a garantia contrajurisdicional do processo, e, não, o poder. Por todas essas razões, a decisão proferida pela 2ª Turma do STF na Arg. Imp. nº 45/RJ, com o beneplácito da Procuradoria Geral da República e da Presidência da Corte, é de lamentar-se.
Casos como o da Arg. Imp. nº 45/RJ, não julgada, no mérito, pelo Plenário do STF, reforçam a necessidade de adoção do regime único de tutela jurídica da garantia da imparcialidade. Neste caso, o resultado do julgamento foi diretamente afetado pela bitola do regime hegemônico, escancarando o constrangimento de uma dualidade graças à qual o mesmo julgador pode ser parcial ou imparcial única e exclusivamente em razão do tipo de procedimento em que dada hipótese se manifesta. Aqui fica nítida a pobreza do estado da arte da tutela jurídica da garantia da imparcialidade no sistema de direito positivo e, principalmente, na dogmática (doutrina e jurisprudência) majoritária em torno dele produzida, que teima em tratar a imparcialidade como se fosse garantia procedimental (=infraconstitucional) e não processual (=constitucional), fragmentando-a e, consequentemente, enfraquecendo-a. Se hipóteses desse tipo não forem capazes de levar o intérprete a considerar – veja que não estou falando em acolher – a proposta de regime único de tutela jurídica da garantia da imparcialidade, talvez nada mais faça.
[1] No mesmo sentido: “ante a impossibilidade de graus distintos de imparcialidade entre os juízes penal, civil e o trabalhista, não se pode admitir que as leis procedimentais penal, civil e trabalhista possuam róis distintos de causas de impedimento e suspeição, sendo injustificável a atual assimetria entre o CPP [artigos 252 e 254], o CPC [artigos 144 e 145] e a CLT [artigo 801]; por isso, as causas descritas nos mencionados dispositivos se complementam reciprocamente, constituindo um regime jurídico único transprocedimental de causas de parcialidade.” (COSTA, Eduardo José da Fonseca. O postulado garantista da interoperabilidade procedimental).
[2] Art. 144. Há impedimento do juiz, sendo-lhe vedado exercer suas funções no processo:
[…]
VIII – em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge […], mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório.
[3] Art. 3º A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito.
[4] Art. 6º Também compete ao Plenário: I – processar e julgar originariamente: […] h) as arguições de suspeição;
[5] “A situação de impedimento acima descrita está contemplada no art. 144, inciso VIII do Código de Processo Civil e não há idêntica previsão no artigo 252 do Código de Processo Penal. Assim, não se aplicam, por analogia ou subsidiariamente, as regras processuais civis ao processo penal, que tem rol taxativo de situações que implicam, objetivamente, no impedimento do juiz para o julgamento do caso. Não há lacuna a ser integrada pela regra do art. 3º do CPP. Quanto às hipóteses de suspeição, também não se vislumbra, da situação acima narrada, adequação típica às situações previstas no art. 254 do CPP” (págs. 8 e 9).
[6] Habeas corpus. 2. Corrupção ativa e lavagem de dinheiro. Operação Eficiência. Prisão preventiva. 3. Impetração contra decisão que indeferiu pedido de liminar em anterior HC no STJ. Posterior julgamento de mérito desse HC. Despicienda qualquer discussão a respeito de eventual superação do óbice contido na Súmula 691/STF. 4. Limites da aplicação do tipo penal objeto do art. 2º, § 1º, da Lei 12.850/2013 a casos de interação entre imputados ainda estão por ser tratados. 5. Perigo que a liberdade do paciente representa à ordem pública ou à instrução criminal pode ser mitigado por medidas cautelares menos gravosas do que a prisão. 6. Concessão da ordem para revogar a prisão preventiva decretada, determinando ao Juízo de origem que analise a necessidade de aplicação das medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP. Precedentes. (HC 143247, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T., j. em 10/10/2017, DJe de 06/02/2018).
[7] BARZOTTO, Luis Fernando. Teoria do Direito. Livraria do Advogado: 2017, p. 28.
[8] BRASILEIRO, Renato. Manual de Processo Penal. 6 ed. Salvador: JusPodivm, 2018, p. 1124.
[9] Art. 96. A argüição de suspeição precederá a qualquer outra, salvo quando fundada em motivo superveniente.
[10] Art. 101. Julgada procedente a suspeição, ficarão nulos os atos do processo principal, pagando o juiz as custas, no caso de erro inescusável; rejeitada, evidenciando-se a malícia do excipiente, a este será imposta a multa de duzentos mil-réis a dois contos de réis.
[11] Art. 285.Afirmada a suspeição pelo arguido, ou declarada pelo Tribunal, ter-se-ão por nulos os atos por ele praticados.
[12] “O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI – Não, eu diria mais, Ministro Toffoli: Se agasalhássemos tal expediente, isso se prestaria a manipular, inclusive, a distribuição. Porque seria muito fácil arguir a suspeição e o impedimento de algum Juiz relativamente ao qual já se soubesse ter uma posição adversa ao pleito da defesa. E não é raro isso no meio forense. […] O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI – Exatamente. Seguimos, em geral, uma mesma orientação, é claro. Então, um advogado ou um membro do Ministério Público poderia facilmente descartar um relator a respeito do qual não se tem confiança ou se entenda que apresentará um resultado adverso. Ou, por meio desse pedido de suspeição ou impedimento, ele afasta o relator do feito, ou, enfim, tumultua todo o andamento processual, atulhando, como Vossa Excelência bem observou, o Plenário da Corte. E ainda quero dizer, que tive oportunidade de examinar, na qualidade de Presidente desta Corte, ao longo de dois anos, talvez centenas de pedidos de suspeição e impedimento. Diria que a grande maioria sem qualquer fundamento jurídico.
Portanto, eu acompanho também essa posição de Vossa Excelência, no sentido de manter aqui nesta Turma o julgamento deste HC” (págs. 30-31).
[13] “Não se pode deixar de registrar aqui o exagero desta situação de impedimento. Em primeiro lugar, é preciso considerar a existência de grandes firmas de advocacia, com atuação em número muito grande de lugares, tendo em alguns casos filiais em diversos Estados da Federação. Imagine-se, então, o caso de um juiz estadual do Rio Grande do Sul que tenha um sobrinho advogado que atue em um escritório de advocacia no Amazonas (do qual sequer é um dos sócios). Considere-se, agora, que o sobrinho do juiz seja um advogado especializado em tributos federais, só atuando perante a Justiça Federal. Pois se o escritório em que atua o sobrinho do juiz tiver, no Mato Grosso, entre seus clientes, uma instituição financeira (como um Banco, por exemplo), ficará aquele juiz do Rio Grande do Sul impedido de atuar nos processos em que aquele mesmo Banco é parte. Haveria aí alguma ligação entre o juiz e a parte capaz de causar sua parcialidade? Certamente não! Há, ainda, outro ponto a considerar. Como poderá o juiz saber quem são todos os clientes do escritório dos seus parentes? Terá ele de exigir de todos os seus parentes advogados uma relação completa dos clientes de seus escritórios? Haverá um dever dos advogados de manter atualizadas essas relações entregues aos seus parentes juízes? Evidentemente não! É, pois, completamente desarrazoada a hipótese prevista na lei, não fazendo sentido estabelecer-se o impedimento do juiz de atuar em processos em que seus parentes não atuam, nem (através de outros advogados) seus escritórios de advocacia, neles sendo parte algum cliente do escritório do parente quando patrocinado por advogados de escritório distinto. Deve-se, então, reputar inconstitucional (por violação do princípio da proporcionalidade) essa parte final do dispositivo, afastando-se o impedimento do juiz nos casos em que o escritório de advocacia que atua no processo não tem, entre seus integrantes, qualquer daqueles parentes do magistrado” (CÂMARA, Alexandre Freitas. Manual de Direito Processual Civil. Barueri: Atlas, 2022).
[14] Embora elogiem o caráter republicano do dispositivo, reconhecem que “nos grandes centros urbanos, em casos envolvendo grandes conglomerados empresariais – os quais, para as ações de cobrança, por exemplo, podem contratar diversos escritórios de advocacia, tendo em vista o grande volume de ações –, é possível que ele seja impraticável”: NERY JR., Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 598.
[15] CARVALHO FILHO, Antonio. Processo como Direito Fundamental: teoria e dogmática do devido processo legal. Belo Horizonte: Casa do Direito / Letramento, 2022. No prelo, gentilmente cedido pelo autor.
[16] LUCCA, Rodrigo Ramina de. Disponibilidade Processual. A liberdade das partes no processo. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019, p. 139, nota de rodapé n. 68.
[17] “O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE E RELATOR) – Senhores Ministros, só uma observação, aqui se pretendeu a aplicação, por tabela, por extensão, do art. 144 do Código de Processo Civil, conforme temos entendido. Inclusive, há decisão do Presidente desta Turma – neste momento ausente -, o Ministro Fachin, no mesmo sentido: De que não se aplica essa cláusula. Na verdade, não sabemos aplicar essa cláusula, que é uma dessas genialidades do CPC, sequer nos processos cíveis: O disposto no § 3º do art. 144” (p. 31).