116. FLEXIBILIZAÇÃO DO PROCESSO?

Calmon de Passos tem muito a nos ensinar.

Flexibilização do processo
Uri Geller entortando uma colher.

É chegada a hora de enfrentarmos o problema da flexibilização do processo no pensamento de Calmon de Passos.

Até o momento, analisamos as bases fundamentais do seu pensamento, com a apresentação dos conceitos de direito e de processo para o mestre baiano. Eles são premissas indispensáveis para a análise que ora se realiza.

Para se chegar ao exame da flexibilização do processo, é necessário entender o conceito de procedimento para Calmon de Passos. Do ponto de vista analítico, ele entende pouco produtiva a distinção conceitual entre processo e procedimento. Sustenta que a divergência é mais “verbal” do que substancial. “Para muitos, procedimento seria a categoria básica e geral, desdobrada em tipos de processo, como modos de proceder em cada espécie de procedimento. Para outros, a categoria lógica é o processo e o procedimento diria respeito ao modo de proceder em cada processo. Ali, um pensamento de matriz kelseniana, aqui um pensamento influenciado pelo procedimentalismo luhmanniano. Em termos práticos, nenhuma divergência relevante. Inclino-me, entretanto, pela versão kelseniana, porque me parece a adequada em face de nossa Constituição. Refere-se ela a processo legislativo e a processo administrativo e quando cuida da disciplina do modo de proceder em cada tipo de processo utiliza o termo procedimento a exemplo do que faz dispondo sobre a competência concorrente dos Estados para legislar sobre procedimentos, reservado à União a competência para disciplinar o processo. Quanto se ponderou e ponderará, aqui, vale para qualquer das duas posições, visto como o fundamental é que há uma categoria geral (seja processo ou procedimento) que se desdobra em modos de proceder distinto (seja processo seja procedimento), diferenciadas a dimensão integrativa (constitucional) e a dimensão meramente pragmática de proceder, distinção, esta sim, essencial.”[1]

O processo é o meio constitucionalmente adequado para a produção de norma jurídica, seja na perspectiva macro (norma geral e abstrata, através de atuação política), seja na perspectiva micro (norma específica e concreta, através de atuação jurídica). Assim, antes de o produto condicionar o processo é o processo que condiciona o produto. Desse modo, esse processo reclama rigorosa disciplina, em todos os seus aspectos – agentes, organização e procedimento –, sob pena de se privilegiar o arbítrio dos decisores.[2] É por essa razão que defende que o devido processo legal poderia ser denominado de devido processo constitucional de produção jurisdicional do direito.[3]

O procedimento tem a especial função de espraiar as garantias contrajurisdicionais do processo nas oportunidades e nos atos processuais das partes, como forma de proporcionar o equilíbrio de posições entre os membros da sociedade democrática, especialmente na relação entre particulares e os poderes públicos.[4] Aqui se nota a preocupação de Calmon de Passos na caracterização do processo e do procedimento como limites materiais ao exercício do poder. Nesse ponto radica a profunda semelhança de seu pensamento com o desenvolvimento do garantismo processual no Brasil.

Por grande influência dos estudos de Canotilho no início da década de 90 e da produção de Konrad Hesse e Peter Haberle no final dos anos 70, Calmon de Passos sustenta a visão da existência de um status activus processualis[5] para cada direito fundamental. É dizer, de cada um dos direitos fundamentais elencados na Constituição, decorre uma dimensão procedimental própria. Por isso, afirma que “para os direitos fundamentais poderem desempenhar a sua função na realidade social eles necessitam, não apenas de uma normação intrinsecamente densificadora, mas também de formas de organização e regulamentação procedimental apropriada.”[6] A aproximação de Calmon de Passos com a doutrina constitucional do status activus processualis decorre de sua visão democrática do processo, que exige mecanismos de participação efetiva de particulares na defesa de seus direitos fundamentais. Dessa noção, verifica-se a existência de deveres de tutela dos direitos fundamentais pelo Estado, em especial, pelo Poder Legislativo, que está encarregado da criação de leis procedimentais, a partir das matérias-primas constitucionais do processo e dos demais direitos fundamentais. Não decorre daqui nenhuma liberdade judicial para substituir, por si, a atuação legislativa, o que seria absolutamente contrário à obra de Calmon de Passos. É neste sentido que o mestre ensina que “os procedimentos constituem, assim, um sistema de interações entre os poderes públicos e os cidadãos ou entre unidades organizatórias públicas, como sugerido por Canotilho. E acrescentamos: não qualquer procedimento, mas o procedimento conformado adequadamente, vale dizer, em harmonia com as exigências básicas do Estado de Direito democrático.”[7]

Muito embora Calmon de Passos não tenha se debruçado sobre o tema da adequação procedimental com mais vagar, nomeadamente porque em seus últimos anos de vida o ponto ainda não era uma febre entre os processualistas – como hoje se vê – existem várias pistas em seus textos sobre os problemas e os perigos de uma teorização da flexibilização do processo ou do procedimento a partir da iniciativa judicial. Ele, por outro lado, enfrentou o modismo doutrinário acerca dos procedimentos especiais, que foi, sem medo de errar, o embrião da adaptabilidade judicial procedimental como hoje defendida. A profusão de procedimentos especiais é decorrente do chamado princípio da adequação do procedimento, no entanto, os seus adeptos ainda se mostravam constrangidos aos limites políticos impostos pela Constituição, ao verificarem a necessidade de lei para a concretização do procedimento. No entanto, essa sanha pela adequação não passou gratuitamente pela lupa crítica de Calmon.

De certo que o mestre baiano estaria de acordo com a previsão do art. 190, do CPC, que permite às partes a celebração de negócios jurídicos processuais atípicos, nomeadamente com a possibilidade de utilização de tal artifício para moldar o procedimento às necessidades de causa presente ou futura. Certamente, ele entenderia que a previsão vai ao encontro da densificação do princípio democrático de participação das partes, que estabelecem, por si mesmas, os limites para a produção do direito pela via jurisdicional.

Pontuamos, contudo, que Calmon seria um tanto quanto cético com relação ao alcance pragmático da norma em questão. Advogado experimentado e experiente que era, e dono da arguta leitura da realidade que apenas os sábios são dotados, ele diria que “isso seria coisa para um ou dois processos e para a venda de muitos livros”, mas jamais para o manancial de outros processos existentes no judiciário. Passados 5 (cinco) anos de vigência do CPC, a prática mostra que o negócio jurídico processual, nada obstante a farta produção doutrinária acerca do tema, não gerou grandes repercussões no dia-a-dia forense.

Calmon sempre foi um defensor do procedimento comum, especialmente do procedimento ordinário previsto no CPC/73. Dizia ele que o procedimento deveria conter exatamente aquilo que estava previsto nas garantias constitucionais do processo, que chamava de “o essencial a todo processo jurisdicional”. Se esse núcleo foi atendido, tudo bem. Se não o foi, tudo mal. “O que comporta avaliação crítica são as mudanças procedimentais simplificadoras que se revelem necessárias e possíveis, sem sacrifício do que é da essência do processo jurisdicional. O princípio da economia processual consiste precisamente nisto – toda formalidade desnecessária para assegurar o essencial no processo a fim de que haja respeito ao devido processo constitucional pode e deve ser descartada. Mas o senso comum também adverte que sendo isso possível, essa simplificação que representa melhoria deve ser efetivada em relação a todos os processos, isto é, deve ser uma simplificação do procedimento ordinário. E deve sê-lo porque procedimento ordinário é aquele modelo que otimiza a tutela jurídica, mediante a tutela jurisdicional, vale dizer o modelo aplicável à quase totalidade dos processos. Procedimento ordinário é o que traduz o excelente para a quase totalidade dos processos, tanto em termos de garantias quanto em termos de economicidade. A perda da perspectiva da dimensão democrática do processo, mesmo por parte daqueles que utilizam o discurso democrático, mas têm pouca vontade ou pouco traquejo para sua prática, é que leva a se identificar o procedimento ordinário como algo negativo. Ele deve ser o procedimento por excelência e se por acaso estiver mal estruturado, tarefa prioritária será dar-lhe a melhor feição possível.[8]

procedimento legislativo

A passagem mostra como Calmon de Passos entende por imprescindível a atuação legislativa prévia a qualquer ajuste ou reajuste procedimental, pois tais câmbios deveriam ser aplicados a todos os litigantes. Essa é uma pista precisa acerca de seu desacordo com qualquer proposta de adaptação procedimental pelo juiz, em um suposto agir de alfaiate, que costuraria o procedimento, na medida exata para a solução do litígio (su misura), como se isso fosse possível. “O que se impõe como técnica e politicamente correto é ter-se um procedimento ordinário excelente, porque ele é o meio a ser empregado na esmagadora maioria dos casos. Péssimo, política e tecnicamente, será optarmos por deixar inadequadamente regulado o que deve servir para a quase totalidade dos litígios e nos perdermos em elucubrações cerebrinas para institucionalizar excepcionalidades.”[9]

Os sequazes da flexibilização do processo sustentam a necessidade de ajuste episódico da causa, como dever do juiz, para as necessidades do litígio, como forma de tutela do direito material em jogo. Malgrado as críticas recebidas a respeito deste ponto em específico, os adeptos da flexibilização jamais as responderam.

Calmon de Passos poderia utilizar, sem qualquer reserva, a seguinte passagem para cerrar colunas com os críticos da flexibilização: “Não devemos encorajar a ressurreição da crença arcaica de que para cada pretensão há um procedimento ideal, ou que seja conveniente agruparmos pretensões e tratá-las de um modo procedimental específico. Essa visão, data venia, cheira a um romanismo arcaico.”[10]

Segue dizendo, em evidente influência de Luhmann, que as relações sociais são qualificadas juridicamente, como forma de garantir a convivência humana: “Essa qualificação se dá, num primeiro momento, mediante uma redução da complexidade no espaço do sistema social, ela é o direito posto, resultado de uma decisão política que formaliza modelos de decidibilidade para os conflitos que se configurarem na convivência social, predeterminando o que é proibido, devido e permitido. Para concreta ordenação da vida social (composição de conflitos) há necessidade de uma segunda redução de complexidade a nível de sistema jurídico, por conseguinte, uma qualificação que se dá mediante a aplicação do direito posto. Neste preciso momento, institui-se a certeza jurídica e o que se cumpria em nível de validade faz-se, socialmente, facticidade.”[11]

Com isto, Calmon pretende estabelecer que o acertamento dos direitos não necessita de especialização alguma. É dizer, o procedimento comum é o de excelência para o acertamento de direitos em geral. A cognição do juiz, neste tipo de procedimento, prescinde de especializações. Exige-se especialização, por outro lado, na efetivação do direito acertado. Assim, a lei deve estar devidamente ajustada para fazer com que o thema decidendum repercuta na esfera fática. Ou seja, o executar deve ser necessariamente diversificado conforme o direito material, dada a variedade de circunstâncias a que pode estar associado o cumprimento do julgado. A especialização a que se alude no caso é na implementação de meios executivos que visem à satisfação do direito material. Assim, as obrigações específicas, em regra, exigem o agir voluntário do devedor para o seu cumprimento do modo ajustado. Nesses casos, que chamamos de responsabilidade pessoal, pois a vontade do devedor importa, exige-se que o Estado possa exercer poderes que visem à indução do devedor à satisfação plena. Nas obrigações genéricas, em especial nas pecuniárias, diante da fungibilidade do bem perseguido, o Estado sub-roga-se na vontade do devedor, atacando o seu patrimônio (responsabilidade patrimonial) para a satisfação do credor.[12] Note-se, conforme a visão calmoniana, que cabe ao legislador estabelecer as balizar necessárias dessa especialização executiva.

quebra-cabeça flexibilização procedimentoO procedimento legalmente estabelecido traz a segurança necessária para que os litigantes em geral saibam, de antemão, as regras que serão aplicadas em seu processo, estabelecendo, em especial, os limites aplicáveis ao poder estatal na intervenção da esfera particular. Os teóricos da flexibilização do processo pretendem transformar essa segurança em um “quebra-cabeças enlouquecedor, ou por injunções do poder político ou conveniência do poder econômico, ou pela necessidade de valorização profissional dos que acreditam seja tão mais valioso o saber quanto mais hermético ele for. Os sacerdotes, durante muitos séculos, dominaram os homens mediante o ocultamento de seu pseudo saber e poder. Hoje, infelizmente, o dito saber científico faz o mesmo caminho. Ele que assentou sua legitimação no nobre propósito de libertar os homens das manipulações cabalísticas, deixa cada dia mais de ser algo inteligível para o senso comum, recolhendo-se ao recinto dos seus templos sagrados (fórmulas, laboratórios, compêndios, teorias e sub-teorias) em cujos umbrais só podemos penetrar, nós ignorantes, com os olhos voltados para o chão e a coluna vertebral curvada em arco. Tal como os antigos sacerdotes, os novos sacerdotes da ciência em verdade são a outra face do poder político e do poder econômico, porque a eles se associaram no propósito de colonização do mundo da vida, o único em que é possível ao homem comum conviver e sobreviver.”[13]

Para além de todos os problemas inerentes à flexibilização judicial do procedimento sob o enfoque da hipertrofia de poderes do Juiz, a teorização neste sentido apresenta muito mais armadilhas do que soluções. É, em última análise, um conhecimento supersubjetivado e localizado, apenas, na cognição privilegiada desse juiz magnífico e magnânimo.

Ela se revela, nos dizeres de Otavio Luiz Rodrigues Jr., como verdadeira tática de guerrilha, pois “nunca se sabe onde está, o que é, suas dimensões e seus efetivos. Pode estar em todos os lugares e em lugar algum. Como estratégia de combate, é um excelente modo de se fomentar o desenvolvimento de um conceito, até porque inviabiliza qualquer crítica sistemática ou tentativa de controle. Para quem decide e não tem grandes preocupações com os custos argumentativos ou a prestação de contas democrática, é um ótimo meio de justificar escolhas aleatórias e jogar com a constitucionalização e seu enorme acervo de princípios e direitos fundamentais para se liberar de qualquer conformação racional dos atos decisórios.”[14]

O procedimento previamente previsto em lei, além de ser a conformação mesma do devido processo legal enquanto direito fundamental previsto na CF (art. 5º, LIV), representa limite formal e material para o agir estatal. É dizer, representa a descrição da blindagem e da proteção dos indivíduos contra as intervenções arbitrárias do poder. Deste modo, o limite ao poder jamais poderá ser manipulado pelo próprio poder para, ao invés de limitar, servir de propulsor do próprio poder.

A partir do pensamento calmoniano, poe-se revelar os problemas dogmáticos da flexibilização. A análise de Calmon passava também pelo plano da pragmática. Embora o excerto que segue tenha sido construído a partir da crítica da adequação do procedimento especial por iniciativa legislativa, ele serve como uma luva para a flexibilização do processo pelo juiz: “Ouso dizer, portanto, que todas as catilinárias contra nosso procedimento ordinário (atual procedimento comum) são uma forma de despistamento, desviando-se a atenção do homem comum do que é fundamental. Se não é bom o procedimento ordinário (comum), isso só pode ocorrer por força de vícios de origem que fazem dele um péssimo procedimento, mas esses mesmos vícios tornarão péssimos quantos procedimentos especiais (ou procedimentos flexibilizados judicialmente) forem maquinados.”[15]

Chegamos assim na contradição das contradições. Os adeptos da flexibilização do processo dirão que existe um “direito fundamental de adequação” e que representa dever do juiz o ajuste do procedimento às necessidades da causa. Calmon de Passos traria a discussão para os pontos mais sensíveis a revelarem a tendência da doutrina em flertar com o autoritarismo judicial. Certamente, ele faria a desconcertante pergunta, nos seguintes termos: Se estamos de acordo que o processo representa um meio de produção normativa, seja no nível macro, seja no nível micro, e que esse processo é devidamente regulamentado pela Constituição e pela Lei no procedimento legislativo e no procedimento administrativo e, tendo em conta que, se o legislador se desviar do procedimento previsto para a criação de lei, ela será tida por inconstitucional e se o administrador se desviar do procedimento administrativo, seja o disciplinar, seja o licitatório, o ato será inválido, por qual razão apenas o Juiz pode manipular o procedimento que o limita? Seria ele um ser especial entre os exercentes do poder? Teria alguma transcendência divina que o sanitizaria de qualquer ordem de autoritarismo judicial? Espera-se a resposta dos flexibilizadores.

Entendemos que os defensores da flexibilização judicial do procedimento pensam que estão agindo “corretamente”, pois buscam soluções para os problemas da nossa democracia frágil. O grande problema é que eles visam resolver os problemas do mundo no nível micro. Acham que através do processo judicial vamos atingir soluções macroscópicas e que as soluções dadas por um juiz seriam mais adequadas e ideais do que aquelas que podem ser obtidas pela via constitucionalmente legítima da política. A vedete da vez é o processo estrutural – para o qual a doutrina flexibilizadora diz que a regra do procedimento é a flexibilização –, embora inexista qualquer autorização legal para tanto. Calmon de Passos, com sua arguta percepção e lembrando que somente a luta política é emancipatória, teria uma provocação aos bem-intencionados: “Ilude-se o povo brasileiro com a empulhação de que se pode solucionar os problemas econômicos, políticos e sociais de um país operando em nível micro, com utilização dos instrumentos jurídicos, quando eles só comportam solução em nível macro e por via do processo político e econômico.”[16]

A flexibilização do processo pelo Juiz somente poderia ser constitucionalmente aceita, nos estritos limites de sua previsão constitucional (que não existe) e legal. O art. 139, VI, do CPC, permite, com balizas muito precisas, apenas a dilatação dos prazos, para o pleno exercício do contraditório, e o reajuste para os meios de prova, para concretizar a regra de que não há precedência da prova pericial sobre a oral, por exemplo. Não há no Brasil, contudo, qualquer autorização para que o juiz realize o ajuste do procedimento como bem entender. Ao contrário, o procedimento é limite ao exercício do poder e sempre deve ser obedecido pelo magistrado.

Se por nossa Constituição o processo é garantia contrajurisdicional de liberdade das partes e se corporifica num procedimento rígido, integral e detalhadamente disciplinado por lei (art. 5º, LIV, da CF), tolerante apenas a adaptações promovidas pelas partes, consensualmente (art. 190, do CPC), ou pelo juiz, dês que para ampliar a proteção e efetividade das garantias processuais (art. 139, VI, CPC), é vedada a delegação de poderes para que o juiz modifique-o, máxime quando não são delimitados prévia e claramente os pressupostos concernentes a se, quando e como ele poderia fazê-lo. [17]

A doutrina, antes de qualquer coisa, possui responsabilidades sobre sua produção. Sua atuação deve sempre ser descritiva a partir do direito posto, buscando soluções de lege lata para os problemas que se sucedem na realidade social. Apenas se autoriza a produção prescritiva quando se adverte o leitor de que a solução é apresentada a partir de uma proposta de lege ferenda, com a necessidade de intervenção do legislador no tratamento político da questão, para transformá-la em jurídica através da nova lei.

Advogar a flexibilização do processo como solução de lege lata, salvo melhor juízo, além de medida irresponsável, representa uma manipulação da realidade através de um poder fictício de “inventar o mundo”. “Seguro concluir-se, portanto, nada vale ‘dizer-se’ que a minhoca é um leão. Esse ‘discurso fútil’ é impotente diante da realidade e a minhoca, em razão dele, não se tornará carnívora, nem capaz de abater um touro, antes porque alienada, será presa fácil do primeiro pinto que a descobrir.”[18]

[1] PASSOS, J. J. Calmon de. O processo administrativo na Constituição de 1988, in Ensaios e artigos, vol. I, Salvador . Editora Juspodivm, 2014, p. 553.

[2] PASSOS, J. J. Calmon de. Instrumentalidade do Processo e Devido Processo Legal, in Ensaios e artigos, vol. I, Salvador . Editora Juspodivm, 2014, p. 33.

[3] PASSOS, J. J. Calmon de. Teoria geral dos procedimentos especiais, in Ensaios e artigos, vol. II, Salvador . Editora Juspodivm, 2016, p. 206.

[4] PASSOS, J. J. Calmon de. Instrumentalidade do Processo e Devido Processo Legal, in Ensaios e artigos, vol. I, Salvador . Editora Juspodivm, 2014, p. 34.

[5] Particularmente, nos afastamos de Calmon de Passos neste ponto. A proposta haberliana do status activus processualis foi uma tentativa de subversão da natureza jurídica dos direitos fundamentais, nomeadamente dos direitos de status negativus. A proposta tem por premissa a hipertrofia de poderes judiciais, o que descambou, através do movimento neoconstitucionalista e de seus companheiros do instrumentalismo processual e da cooperação processual, em subverter direitos processuais de resistência, como o devido processo legal e o contraditório, em direitos de status positivus. Com isso, os juízes passaram a arvorar-se de “poderes implícitos”, que descambaram em autoritarismo e ativismo judiciais. Certamente, Calmon de Passos não vislumbrou estes perigos, quando de sua adesão à proposta. Não resta dúvida, por outro lado, de que, se vivo fosse, apresentaria sérias críticas à subversão ora apresentada.

[6] PASSOS, J. J. Calmon de. O processo administrativo na Constituição de 1988, in Ensaios e artigos, vol. I, Salvador . Editora Juspodivm, 2014, p. 551.

[7] PASSOS, J. J. Calmon de. O processo administrativo na Constituição de 1988, in Ensaios e artigos, vol. I, Salvador . Editora Juspodivm, 2014, p. 553.

[8] PASSOS, J. J. Calmon de. Teoria geral dos procedimentos especiais, in Ensaios e artigos, vol. II, Salvador : Editora Juspodivm, 2016, p.207.

[9] PASSOS, J. J. Calmon de. Teoria geral dos procedimentos especiais, in Ensaios e artigos, vol. II, Salvador : Editora Juspodivm, 2016, p. 207.

[10] PASSOS, J. J. Calmon de. Teoria geral dos procedimentos especiais, in Ensaios e artigos, vol. II, Salvador : Editora Juspodivm, 2016, p. 207.

[11] PASSOS, J. J. Calmon de. Teoria geral dos procedimentos especiais, in Ensaios e artigos, vol. II, Salvador : Editora Juspodivm, 2016, pp. 207-208.

[12] Ver mais em CARVALHO FILHO, Antônio. SOUSA, Diego Crevelin de. PEREIRA, Mateus Costa. Réquiem às medidas executivas atípicas nas obrigações pecuniárias – art. 139, IV, do CPC – Londrina : Editora Thoth, 2020. p. 55 e ss.

[13] PASSOS, J. J. Calmon de. Teoria geral dos procedimentos especiais, in Ensaios e artigos, vol. II, Salvador : Editora Juspodivm, 2016, p. 209.

[14] RODRIGUES JR, Otavio Luiz. Direito civil contemporâneo: estatuto epistemológico, constituição e direitos fundamentais – 2. ed. – Rio de Janeiro : Forense Universitária, 2019, p. 237.

[15] PASSOS, J. J. Calmon de. Teoria geral dos procedimentos especiais, in Ensaios e artigos, vol. II, Salvador : Editora Juspodivm, 2016, p. 210.

[16] PASSOS, J. J. Calmon de. Teoria geral dos procedimentos especiais, in Ensaios e artigos, vol. II, Salvador : Editora Juspodivm, 2016, p. 212.

[17] PASSOS, J. J. Calmon de. Cidadania e efetividade do processo, in Ensaios e artigos, vol. I, Salvador . Editora Juspodivm, 2014, p. 395.

[18] PASSOS, J. J. Calmon de. Cidadania Tutelada, in Ensaios e artigos, vol. I, Salvador . Editora Juspodivm, 2014, p. 380.

Autor

  • Antonio Carvalho Luciana Benassi contraditor

    Antônio Carvalho Filho é Doutorando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), Mestre em Direito pela Universidade de Coimbra, Especialista em Direito Internacional Público e Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra e Instituto Ius Gentium Conimbrigae, Parecerista “ad hoc” da Revista Brasileira de Direito Processual (RBDPro), Membro-Fundador e Vice-Presidente (triênio 19/22) da Associação Brasileira de Direito Processual (ABDPro), Membro do Instituto Panamericano de Derecho Procesal (IPDP), Diretor Executivo da Associação dos Magistrados do Paraná (AMAPAR) e Juiz de Direito no TJPR.
    Luciana Benassi Gomes Carvalho é Doutoranda em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), Mestra em Direito pelo Centro Universitário Internacional – Uninter, Especialista em Direito Constitucional, Membro da Associação Brasileira de Direito Processual (ABDPro), Membro do Instituto Panamericano de Derecho Procesal (IPDP), Diretora de Relações Humanas da Associação dos Magistrados do Paraná (AMAPAR) e Juíza de Direito no TJPR



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